Dia Mundial da Doença de Chagas: Fiocruz Paraná promove encontro que debate avanços e desafios

por / quarta-feira, 17 Abril 2024 / Categoria Instituto Carlos Chagas

Em 14 de abril é celebrado o Dia Mundial da Doença de Chagas. Para marcar a data, o Instituto Carlos Chagas (ICC/Fiocruz Paraná) realizou, no dia 15, uma programação especial que discutiu os avanços e desafios da enfermidade, descoberta há 115 anos. Associado ao Programa de Pesquisa Translacional em Doenças de Chagas (Fio-Chagas), o evento recebeu como convidados as coordenadoras do programa, as pesquisadoras Rita de Cássia Moreira de Souza e Gloria Bonecini de Almeida; o cientista e historiador Alejandro Hasslocher, do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/Fiocruz; e as pesquisadoras Nazaré Soeiro e Joseli Lannes, do Instituto Oswaldo Cruz/Fiocruz. A roda de conversa incluída nas atividades foi mediada pelo pesquisador Samuel Goldenberg, da Fiocruz Paraná.

Na abertura das atividades, o diretor da instituição, Stenio Fragoso, deu boas-vindas a todos e ressaltou a importância do evento. “A doença de Chagas é uma doença silenciosa e silenciada. Silenciosa porque o seu curso clínico é lento e muitas vezes assintomático. Silenciada porque as pessoas acometidas são, principalmente, pobres em condições de vulnerabilidade, sem voz política ou acesso a serviços de saúde.”

Estima-se que atualmente cerca de 16 milhões de pessoas estejam infectadas pelo Trypanosoma cruzi e entre 75 e 90 milhões corram o risco de se tornarem infectadas. Originária da América Latina, casos da doença foram registrados em outros continentes por conta da migração das pessoas.

Fio-Chagas mobiliza 139 servidores para as pesquisas sobre a doença

As pesquisadoras da Fiocruz Paraná Fabíola Holetz, coordenadora do Fio-Chagas no instituto, e Andrea Avila foram as anfitriãs do encontro, que foi iniciado com a fala das coordenadoras gerais da iniciativa, Rita de Cássia Moreira de Souza e Gloria Bonecini de Almeida. As duas contaram o contexto histórico da iniciativa e sobre as perspectivas de erradicar a Doença de Chagas no Brasil até 2030. Atualmente, o Fio-Chagas conta com 139 servidores dedicados à pesquisa em todo o país, com uma vasta experiência variando de 4 a 40 anos. O programa Fio-Chagas tem como missão central ser protagonista na pesquisa relacionada à doença e gerar produtos aplicáveis ao Sistema Único de Saúde (SUS). Além disso, busca ser referência na elaboração de estratégias de vigilância e educação para conscientização da população sobre a doença. A iniciativa visa estimular a cooperação interna na Fiocruz para enfrentar os desafios atuais da doença de Chagas, assegurando uma contribuição efetiva para o controle da doença no século XXI.

Ao promover a articulação entre grupos de pesquisa e desenvolvimento tecnológico em saúde coletiva, o Fio-Chagas visa fornecer respostas para as necessidades críticas no controle da Doença de Chagas. O programa faz articulação com DNDi, organização internacional sem fins lucrativos que desenvolve tratamentos seguros, eficazes e acessíveis para os pacientes acometidos pelas doenças negligenciados.

(Da esquerda para direita): Alejando Hasslocher, Nazaré Soeiro, Gloria Bonecini, Rita Moreira de Souza, Fabíola Holetz, Andréa Avila e Stenio Fragoso.

Pesquisa clínica e novos medicamentos

O cientista e historiador Alejandro Hasslocher, do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas/Fiocruz, fez um panorama histórico da pesquisa clínica da Doença de Chagas de 1909 até os tempos atuais, reforçando o brilhantismo do trabalho de Carlos Chagas, reconhecido mundialmente. Alejandro resgatou os primeiros artigos publicados e traçou um avanço nas pesquisas. “Atualmente, podemos falar sobre as perspectivas no tratamento, que incluem a possibilidade de novas drogas, na epidemiologia, área em que não eliminamos a transmissão congênita no Brasil, e no diagnóstico, com a busca por testes rápidos”, ponderou o pesquisador. Nos dias de hoje, a doença está presente em todos os países latino-americanos, tem diferentes formas de transmissão e causa cerca de 10 mil óbitos por ano.

Alejandro Hasslocher, alertou para o impacto da transmissão alternativa da doença por ingestão de alimentos e de forma congênita, para que haja investimento na enfermidade que é um problema de saúde pública, mesmo que negligenciada. “Há duas semanas, um estudo do Ministério da Saúde mostrou que no Brasil onde se acreditava que havia, no máximo, 3 milhões de portadores, há estimativas de 4,7 milhões. Destes, 2/3 são mulheres, 600 mil delas em idade fértil. Se colocarmos uma taxa de transmissão congênita de 1%, teremos cerca de 60 mil crianças nascendo com Chagas no Brasil anualmente. As evidências epidemiológicas e clínicas são robustas e, por isso, não se pode dizer que não há necessidade de investimento nas pesquisas e ações para o enfrentamento da doença”, finalizou.

A quarta convidada da programação, a pesquisadora Nazaré Soeiro, do IOC/Fiocruz, apresentou resultados de estudos relacionados a substâncias candidatas a fármacos para o enfrentamento da doença. Segundo ela, alguns fatores configuram grandes desafios para o tratamento. “Os tratamentos disponíveis têm uma baixa efetividade. O período de tratamento é longo, o que resulta em uma não adesão dos pacientes. Menos de 10% dos afetados são diagnosticados e apenas 1% realiza o tratamento”, disparou Nazaré. “As lições fornecidas pelos ensaios clínicos contribuem positivamente nesse cenário para orientar as discussões que visam identificar novas terapias alternativas ao tratamento disponível atualmente, que é o mesmo desde a década de 1950”, concluiu.

Para finalizar as apresentações, a pesquisadora Joseli Lannes, também do IOC/Fiocruz, falou sobre o tema “100+15 anos da descoberta da Doença de Chagas: o tempo não para. Tempo de vacina e multiterapia?”.  Em uma linha do tempo, a convidada delineou a trajetória das pesquisas e destacou alguns gargalos existentes. “Garantir aos portadores acesso ao diagnóstico e acompanhamento clínico, estudar a patogênese, vencer as resistências, formar equipes multidisciplinares e obter financiamento são desafios que precisam ser vencidos depois de 115 anos da descoberta. Os pacientes estão esperando”, finalizou Joseli.

A pesquisadora também falou sobre as ferramentas de informação e comunicação relacionadas à doença, como o Portal da Doença de Chagas, o documentário “Doença de Chagas: Virando o Jogo” e os “Ciclos de Palestras Carlos Chagas”.

Roda de conversa

O pesquisador Samuel Goldenberg, da Fiocruz Paraná, foi o mediador da roda de conversa que fechou a programação. O cientista é reconhecido nacional e internacionalmente por sua dedicação aos estudos sobre os mecanismos de regulação da expressão gênica do Trypanosoma cruzi, o agente causador da doença de Chagas, que levaram ao desenvolvimento da primeira patente internacional da Fiocruz, um kit diagnóstico para doença de Chagas, em 1990. Ele lembrou dos grandes nomes, além de Carlos Chagas, que escreveram a história da doença no país como Franscisco Laranja – que pode conhecer em 1982, na época o último sobrevivente da equipe de Chagas –, José Coura, João Carlos Pinto Dias, entre outros. “Essas pessoas precisam ser reverenciadas e homenageadas, já que construíram a história da doença de Chagas e da Fiocruz de alguma forma. A Fundação é a instituição mais importante nas pesquisas sobre a doença”, reforçou. “Os mais jovens precisam conhecer essa história e ela está contada no Portal da Doença de Chagas, um espaço com um conteúdo excelente e que deve ser acessado”, concluiu. Os convidados responderam perguntas do público e geraram um debate importante para a troca de experiências e o aprendizado.


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