Projeto do ICC contemplado no Programa Inova Fiocruz abre uma nova perspectiva para a pesquisa na instituição

por / sexta-feira, 17 julho 2020 / Categoria Instituto Carlos Chagas

Proposta reforça a área de promoção e prevenção como base para conectar o instituto com os profissionais de saúde e com a população

Agregar a atuação com pesquisa básica e com o desenvolvimento tecnológico, já consolidada no Instituto Carlos Chagas (ICC/ Fiocruz Paraná), com a área de promoção e prevenção à saúde. Essa é a proposta da pesquisa “Escala de risco e vulnerabilidade para a Atenção Primária de Saúde – uma nova proposta a partir da ficha de cadastro individual”, contemplada no Programa Inova Fiocruz. Em entrevista, a coordenadora de Extensão do ICC, Maria das Graças Rojas Soto, que lidera o projeto, fala sobre a nova perspectiva de pesquisa que a iniciativa traz ao Instituto e reflete sobre o que ela pode significar para o futuro da instituição. Confira!

O ICC é um instituto de pesquisa que tem atuação, prioritariamente, na pesquisa básica, no desenvolvimento tecnológico e na formação, por meio de seu programa de pós-graduação. Como surgiu essa nova frente de pesquisa que engloba ações direcionadas diretamente à população, profissionais e serviços do Sistema único de Saúde?

Este é um desejo que se desenhou desde que cheguei ao ICC, vendo o nível de excelência dos trabalhos aqui desenvolvidos, e, ao mesmo tempo, observando as necessidades da população com quem atuamos. Consolidado em sua atuação com pesquisa básica e desenvolvimento de conhecimento e produtos tecnológicos, a área de promoção e prevenção é um braço importante para conectar o Instituto com os profissionais de saúde e com a população, trazendo para dentro da instituição as necessidades constatadas na ponta, no usuário final de nosso trabalho diário.

E a proposta da pesquisa surgiu com essa base?

A pesquisa em Atenção Primária em Saúde é uma área nova que está se abrindo para o ICC, mas vejo isto como uma decorrência natural das ações de extensão e divulgação científica, que levam à sociedade os avanços das pesquisas realizadas no Instituto. Quando se chega para dizer algo à população, é necessário e sábio também escutar o que tem ela a nos dizer. Ouvir suas demandas nos provoca, no mínimo, a inquietação que faz nos questionarmos sobre o que poderíamos fazer para saná-las. Aí, pronto, fechou-se a equação pesquisa-serviço-usuário. Neste momento, o edital Inova nos dá uma oportunidade única de estreitar nossos laços com o serviço de saúde, o território e a comunidade, e trazer para dentro do ICC uma demanda do SUS que temos o potencial de solucionar. É um caminho novo que se vislumbra, que demanda um espírito inovador àqueles que têm seus trabalhos consagrados em outras áreas, mas que, cientistas que são, inquiridores e exploradores, abraçam um desafio desconhecido.

Qual o principal objetivo do seu projeto?

O principal objetivo é elaborar e validar uma escala de estratificação de vulnerabilidade e risco familiar para uso da APS. Uma vez validada, vamos ao passo seguinte que é divulgar o instrumento que desenvolvemos. O SUS preconiza um trabalho consistente na APS para evitar internações que, em princípio, seriam desnecessárias. Para isto, a equipe de Saúde de Família necessita de um instrumento sensível de observação dos riscos de adoecimento a que essa família está exposta em seu território, que podem vir a resultar em internação, caso não sejam tratados em tempo. Para que seja efetivo, é necessário que este instrumento considere aspectos biopsicossociais do território e determinantes sociais da saúde, que são dinâmicos no tempo.

A escala mais utilizada atualmente com este propósito tem por volta de dez anos, tempo este em que houve mudanças sociais consideráveis no país, além daquelas de perfil epidemiológico, razão pela qual sua construção pode estar defasada frente aos componentes atuais no processo saúde-doença. Com isto, perde sensibilidade e acurácia, permitindo falhas no sistema de triagem e encaminhamento da APS. A ideia, então, é desenvolver um produto aplicável, efetivo e útil para auxiliar a equipe de trabalho da APS, melhorando a obtenção e gestão de dados de seu serviço, e permitindo o redirecionamento de esforços e recursos humanos para desafogar a rede hospitalar.

 Como vê a importância da pesquisa no contexto da atuação do ICC regional e nacionalmente?

Esta pesquisa posiciona, ainda mais, o ICC no cenário regional e nacional, uma vez que está em consonância com diretrizes estabelecidas no VIII Congresso Interno da Fiocruz, que preveem o fortalecimento do diálogo com a sociedade e as pesquisas translacionais que conversem com as necessidades do território, para gerar soluções inovadoras para a atenção e vigilância em saúde.

O trabalho que irá desenvolver contempla temas como sistemas e métodos de vigilância em saúde, desigualdades sociais e modelo de desenvolvimento e saúde, além de tecnologias e práticas em saúde. Qual a sua expectativa em relação à pesquisa nesses assuntos?

Estou muito esperançosa e confiante neste nosso primeiro passo nessa direção. Eu diria que no ICC escolhemos trilhar um caminho particular: consolidada a pesquisa de bancada, investimos na extensão e divulgação científica e agora complementamos com a prevenção e vigilância. O que é, na verdade, uma relação dialética – a comunicação entre o que é produzido no centro de pesquisa e qual é a necessidade da população nos territórios – e quem faz esta ponte, ou seja, o fio que carrega a comunicação, é o setor de extensão e divulgação científica. Esta é uma comunicação que demanda dois interlocutores, e, para que ela seja efetiva, é importante conhecer e ouvir a ambos.

A proposta da APS é cuidar dos territórios evitando internações. O objetivo é nobre e muito bem desenhado, porém ainda são poucas as ferramentas de que se dispõe dentro do cuidar, são fragilidades para as quais a pesquisa pode contribuir. As ações de vigilância são importantes para identificar situações de vulnerabilização e contribuir para a formulação de projetos de pesquisa para saná-las. Este projeto foi concebido buscando acolher as necessidades do território.

Assim, a Fiocruz Paraná afirma seu papel como instituição estratégica para o fortalecimento da vigilância em saúde, contribuindo para a articulação de suas ações nos vários campos da saúde e desenvolvendo projetos institucionais referenciados nas necessidades do SUS, como proposto nas Teses 5 e 7 das diretrizes da Fiocruz.

Há parcerias no projeto?

Sim, há parceria com a Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), com pesquisadores que têm um trabalho robusto com a APS. O professor Nathan Aratani, coordenador adjunto deste projeto, atua na Saúde Coletiva, principalmente com APS e Gestão e Planejamento, com vasta experiência na avaliação de ações, programas e políticas de saúde. Sua vivência e conhecimento do campo da APS permitiram chegar ao objeto de nosso estudo. A lacuna constatada, que deu espaço para a proposição do instrumento deste projeto, é resultado da atuação prática desta equipe da UFMS.

Como surgiu esta parceria e como irá agregar?

A parceria com o professor Aratani data de anos, quando estive lotada na Fiocruz Mato Grosso do Sul, e juntos desenvolvemos vários projetos de vigilância, promoção, prevenção e divulgação em saúde pública. É uma equipe cujos conhecimentos e prática nos oferecem um respaldo sólido e consistente para uma primeira incursão do ICC nessa temática. Por esta razão, coleta de dados e testagem serão realizadas no MS, pela fluidez de articulação das instituições e familiaridade no trânsito nos serviços de saúde. Uma vez validado o instrumento, o ICC fará a divulgação científica deste nos estados do MS e PR. O projeto pretende aproveitar ao máximo as expertises dos pesquisadores de cada instituição para o cumprimento do objetivo. 

Quanto tempo de trabalho o projeto vai exigir? Como ele será realizado?

A duração do projeto é 24 meses. Podemos pensar em três fases: criação do instrumento; aplicação e testagem; divulgação científica do processo e do produto. A primeira fase envolve revisão sistemática de literatura, definição de plano amostral, desenvolvimento do instrumento e fortalecimento das parcerias – esta será desenvolvida pelo ICC e UFMS conjuntamente; a segunda fase, de coleta de dados e validação, será realizada pela UFMS; e a terceira fase, de divulgação científica aos serviços de saúde e aos pares, será realizada pelo ICC.

Qual a importância desse projeto ter sido aprovado no edital Inova da Fiocruz?

O edital Inova talvez seja a oportunidade perfeita para inserir a pesquisa em APS no ICC. Este edital contempla a formação de uma Rede Temática de Pesquisa em APS, composta pelos coordenadores dos projetos aprovados, cujo primeiro encontro já está agendado para o dia 10 de agosto próximo. Ou seja, com esta aprovação, o ICC está automaticamente inserido em uma rede nacional de pesquisa sobre o tema, com a garantia de trocas de experiências e conhecimento com profissionais de excelência nessa área. Aliado a isto, está o próprio recurso financeiro. Ambos fatores que possibilitam que nossa nova área já venha amparada por um aporte que não demanda risco institucional. 

Como enxerga esse novo braço de pesquisa no ICC nos próximos anos?

Este é um projeto integrado que nos abrirá muitas parcerias. Foi concebido aliando pesquisadores, professores, profissionais de saúde, técnicos, gestores públicos e população, para atuar juntos no estudo. Integra, assim, pessoas, instituições de pesquisa e de serviço de dois estados, e se agrega a uma rede de pesquisa nacional. Veja que, em todos os níveis, oportuniza a expansão e o fortalecimento de parcerias intra e extrainstitucionais e potencializa suas ações, além de dar maior visibilidade ao trabalho realizado pelo ICC para a comunidade externa, reforçando o papel da Fiocruz na execução de projetos de pesquisa e inovação para o SUS.

O estabelecimento de vínculos com as secretarias municipais e estaduais de saúde, com os serviços de saúde, com os agentes comunitários e equipes de saúde da família, requerem uma articulação intensa que não costuma ser fácil e tampouco rápida. Nossa atuação com as ações de extensão e divulgação científica pressupõem essa vinculação fortalecida como meio de atingirmos a população. A academia não chega ao povo senão por meio dos serviços. O desenvolvimento deste projeto poderá nos dar uma espécie de carta de apresentação sobre nossa intenção de trabalharmos orientados para o território e para a população, o que nos abrirá caminho junto a estas instituições.

O que espera a partir desta pesquisa?

Espero que nosso trabalho renda frutos para além do instrumento proposto e esta colaboração pontual com a APS. Que nosso trabalho com o território sensibilize nosso olhar para a importância da população e suas demandas, e que façamos por merecer o convite ou a abertura para entrar em suas vidas e no planejamento das instituições que trabalham diretamente com a população. Que possamos, enfim, dar um passo além, em nosso compromisso com o SUS e a sociedade, alinhados com nossa missão institucional.

 


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